Coronavírus: fechamento de áreas comuns de condomínios
Pandemia pede cuidados de todos do condomínio e tomada de decisões do síndico
Devido à já esperada expansão dos casos de coronavírus no País, o síndico brasileiro se viu em um dilema nos últimos dias: “devo fechar as áreas comuns do meu condomínio?”.
Muita gente já se encontra em isolamento social em suas unidades, mas quer levar as crianças para a brinquedoteca, piscina ou parquinho para dar uma distraída nos pequenos… quem sabe mais tarde ir à academia para também queimar um pouco dessa energia e ansiedade, que tem consumido a todos.
Mas é importante salientar que nem sempre isso é possível. E que o síndico poderá ser taxado de autoritário fechando todas as áreas comuns – mas também de negligente se não fizer nada. É, como sempre na gestão condominial, uma combinação que envolve pró-atividade, escuta da maioria e do conselho e, é claro, sempre visar o bem comum.
“De acordo com o que eu sei, não há nenhuma recomendação do Ministério da Saúde referente às áreas internas do condomínio, mas se tratando de um vírus novo, o ideal é mesmo diminuir a aglomeração”, ensina Ana Carolina Marcos, infectologista pediátrica.
É certo que todos queremos diminuir as aglomerações e colaborar para o achatamento da curva de contágio da doença no País. Para isso, temos que evitar o contato com as outras famílias sempre que possível.
“O fechamento das áreas comuns segue diretriz do que está sendo feito no estado e no município. Por exemplo, semana passada o governador João Doria determinou o fechamento das academias do estado de São Paulo. Vale a pena deixar a do seu condomínio aberta? Eu entendo que não”, assinala o advogado especializado em condomínios Rodrigo Karpat.
Áreas onde pode ocorrer o contágio
Como disse a dra. Ana Carolina Marcos, o vírus é novo e ainda há muitas perguntas sem resposta. Mas é importante que os síndicos tomem todos os cuidados possíveis para evitar que a pandemia se espalhe pelas áreas comuns.
“Os elevadores, por exemplo, o melhor mesmo é não dividir com outras famílias, além da higienização mais completa com álcool gel”, explica ela.
Mas não é só nos elevadores onde pode haver aglomeração. Áreas fechadas, como brinquedotecas, salão de festa e até a guarita do porteiro pedem uma reflexão por parte não só do síndico, mas de toda a comunidade.
E as áreas abertas, que a princípio não deveriam preocupar tanto como o playground, quadras e a churrasqueira, também merecem questionamentos se valem a pena estar abertas.
“É interessante que o síndico divida a decisão com o conselho, sendo sempre de suma importância guardar as notícias e reportagens sobre o assunto para eventuais questionamentos futuros”, aponta José Roberto Graiche Junior, presidente da Aabic, associação das administradoras de condomínios e vice-presidente do Grupo Graiche.
Essa também é a orientação de Marcio Spimpolo. “O síndico deve ter cuidado com esse tipo de medida, já que ele é o representante legal do condomínio. Conversar com os moradores e com o conselho, seja por whatsapp ou outra forma, demonstram o caráter democrático das suas decisões”, argumenta ele. Importante guardar essas conversas caso, no futuro, ele venha a ter problemas com essas medidas, complementa Spimpolo.
Outro ponto levantado pelo advogado se refere às cidades onde não há casos confirmados. “Nesses casos, em residenciais menores, talvez possa-se adotar um revezamento no uso das áreas, uma família de cada vez”, sugere.
Confira, abaixo, os argumentos dos especialistas para cada área comum do condomínio. Para não haver risco de desacato às recomendações e incorrer em aglomeração, entidades setoriais indicam o fechamento de todas as áreas.
Piscinas
“O cloro da piscina poderia matar qualquer coisa que estivesse por ali, mas como o vírus é muito novo, não temos como ter certeza”, assinala a infectologista.
Há também que se pensar na limpeza completa de todas as superfícies, como mobiliário, por exemplo.
Playgrounds/parques/quadras
No caso do estado de São Paulo, o governador João Doria determinou o fechamento de parques públicos, que costumam juntar muitas pessoas, especialmente nos finais de semana. O mesmo pode ser replicado em espaços semelhantes nos condomínios.
“Sabemos que o vírus pode permanecer por até nove dias em superfícies. Se uma criança infectada brincar por ali, e contamine o local, se não houver limpeza, outra criança pode levar o vírus para casa e infectar a sua família, aumentando a transmissão viral”, argumenta a médica Ana Carolina Marcos.
O uso do local seria recomendado apenas se o condomínio tivesse condições de higienizar todo o local com álcool 70% após cada uso.
Para pais e crianças não ficarem confinados apenas nas suas unidades, o recomendado é descer para as áreas abertas, quando estiverem vazias, e levarem seus próprios brinquedos, sem contato com crianças de outras unidades.
“O mais importante é: percebeu que tem mais gente no mesmo ambiente, mesmo que ao ar livre? Suba para a sua unidade”, alerta ela.
Churrasqueira da área comum
“Acho que temos que ter bom senso. Se estão falando em isolamento social, não vamos marcar festas para usar a churrasqueira”, aponta Rodrigo Karpat.
Quem tiver uso marcado para as próximas semanas deve procurar a administração do seu condomínio e, caso já tenha pago pelo uso, deverá ser ressarcido.
Brinquedoteca
As áreas fechadas já pedem mais cuidado no uso de todos. Por mais que a brinquedoteca seja um espaço muito caro às crianças moradoras, geralmente conta com muitos itens, brinquedos pequenos.
“É muito difícil fazer a higienização correta de todos esse itens. Como uma piscina de bolinha vai ser higienizada? Itens pequenos? Essas superfícies podem sim causar contaminação”, alerta a dra. Ana Carolina Marcos.
Salão de festas
É importante evitar qualquer tipo de aglomeração, ainda mais em ambientes fechados – principalmente porque o uso do salão de festas geralmente não envolve uma única família.
“Além disso, o uso do espaço vai fazer com que mais gente de fora circule pelo ambiente, o que também entendo que fragiliza o condomínio nesse momento. O indicado, na minha perspectiva, é fechar”, analisa Rodrigo Karpat.
É importante ressaltar que todos os espaços utilizados devem ser sempre higienizados. Vale a pena questionar se o quadro do seu condomínio terá condições de operacionalizar essa limpeza – sempre a cada uso. Em caso negativo, o mais indicado é mesmo fechar o local para uso.
Outras medidas
Não é só o uso das áreas comuns que está preocupando o síndico. Confira abaixo algumas outras medidas de segurança:
PRESTADORES DE SERVIÇO DOS MORADORES: Pode ser um personal trainner, o professor de violão, de inglês. Vale a pena seguir com esse tipo de visita?
“Entendo que esse tipo de medida pode ser duro, mas o ideal é suspender esse tipo de visitação. Quanto mais gente circulando pelas áreas comuns, mas fragilizado fica o esquema de isolamento social”, aponta Rodrigo Karpat.
E completa: “Veja, não estamos falando em proibir pessoas estranhas ao prédio. Estamos apostando em um pacto coletivo para diminuir a transmissão viral em toda a nossa sociedade. E isso inclui os nossos condomínios.”
OBRAS EM ÁREAS COMUNS OU PRIVATIVAS: As mesmas só devem acontecer se realmente não puderem ser paradas.
Mesmo nas unidades privativas, a recomendação é que se paralisem as reformas.
Além de diminuir o número de pessoas estranhas ao condomínio circulando no local, também é importante parar para evitar pó ou outros agentes que possam irritar as vias aéreas.
“Caso não seja possível parar a obra, é importante fazer um rodízio de funcionários trabalhando no local, diminuindo assim o número de pessoas no condomínio”, assinala a médica.
RECEBIMENTO DE ENTREGAS/DELIVERY: Há a possibilidade de contágio via entrega, sim. Mas com o isolamento social, fica difícil proibir a entrega de itens no condomínio. De supermercado à farmácia, passando pela pizza de sábado à noite, fica difícil ou quase impossível, não permitir que os moradores recebam esses itens.
O mais importante é que os moradores devem ir à portaria receber suas encomendas – como, inclusive, sugerimos no SíndicoNet sempre, pela segurança do condomínio em geral.
“Se o entregador estiver doente, pegamos o pacote da mão dele com vírus e podemos nos contaminar sim. O ideal é lavar todas as superfícies dos produtos e higienizar as mãos logo ao chegar em casa, evitando, assim, contaminar outras superfícies”, ensina a infectologista Ana Carolina.
Tomada de decisões
Como podemos ver, o síndico tem uma série de decisões para tomar – o que ele deve fazer com muita sabedoria e calma.
“Embora o direito de propriedade seja protegido pela Constituição Federal, fato é que, em meio ao caos que estamos vivendo, esse tipo de direito fica relativizado, sempre em prol do interesse coletivo, que se sobrepõe ao individual. Tanto é verdade que temos nos deparado com providências das autoridades que interferem até mesmo no direito de ir e vir dos cidadãos”, explica Graiche Junior.
O síndico poderia, em um primeiro momento, recomendar que se fechem os espaços. Vendo que não surtiu efeito, imediatamente deve proibir e fechar.
Para Marcio Spimpolo, seria importante que os gestores dos condomínios tivessem uma linha mais clara a seguir.
“Minha opinião pessoal é que tudo deveria já estar fechado. Mas se não há um decreto municipal, estadual ou federal, o síndico pode ficar em uma posição mais fragilizada, judicialmente falando”, ele argumenta.
Em Ribeirão Preto, cidade do interior de São Paulo, por exemplo, o prefeito proibiu, via decreto, qualquer tipo de reunião pública ou privada – dando assim poder aos síndicos de cancelar festas que porventura estivessem agendadas no salão de festas.
“Caso o morador fosse adiante e usasse o espaço, seria possível acionar a polícia militar que, devido ao decreto, poderia finalizar o evento”, conta o advogado.
Por outro lado, o síndico que esperar leis ou decretos para tomar decisões referentes ao uso das áreas comuns pode ser, depois, taxado de negligente.
“Não é prudente permitir aglomerações no condomínio na situação atual. Se o síndico desejar seguir com uma assembleia, por exemplo, onde haverá aglomeração de pessoas, moradores ou conselheiros podem, sim, procurar a autoridade sanitária local ou até o plantão judiciário, pedindo a suspensão do encontro”, sugere Rodrigo Karpat.
Para o especialista, estamos vivendo um momento diferente, com muito acontecendo ao mesmo tempo e várias mudanças – e o síndico é o responsável pelo condomínio.
“O síndico tem, sim, o poder executivo de determinar em prol da saúde e do bem-estar coletivo. Isso impõe tomar medidas que sejam para o bem comum”, explica.
Fonte: Sindiconet