Condômino inadimplente: quais os direitos afetados no Código Civil
O condômino inadimplente é o proprietário de uma unidade autônoma e de sua fração ideal que deixa de arcar com os custos repartidos em condomínio e, assim, pode vir a sofrer sanções, desde que conforme o regimento do condomínio, o Código Civil, o Novo CPC e a jurisprudência.
Condômino inadimplente pode acessar as áreas comuns?
O assunto vida em condomínio e seus reflexos jurídicos já foi abordado em outras oportunidades aqui na coluna. E não importa quantas vezes ele seja comentado, a bem da verdade é que a reunião de pessoas gera sim uma zona de tensão e de grande desafio para os profissionais cujas atividades permeiam a relação condominial. A restrição de direitos do condômino inadimplente, por exemplo, é algo que, não raras vezes gera dissabores entre os conviventes do condomínio. E tanto o Direito Imobiliário, quanto o Direito Condominial em seu afunilamento, então, acabam presentes na vida de muitas pessoas.
No que se refere aos direitos do condômino inadimplente, vale lembrar, que, na hipótese jurídica do condomínio edilício, aquele que detém o domínio da unidade autônoma, também é cotitular da propriedade das partes comuns do prédio.
Desse modo, é conferida a ele a capacidade para exercer todos os poderes próprios da propriedade. Todavia, para o bom andar da convivência da comunidade condominial, o exercício desses direitos encontram-se sujeitos à regulamentação, seja por meio da convenção ou pelo regimento interno.
Condomínio edilício no Código Civil e os reflexos nos direitos do condômino inadimplente?
Aliás, quando se trata de condomínio edilício é sempre bom ter em mente que a interpretação do caso concreto exige uma adequação de interesses comuns e particulares. E dessa forma, deve sempre ser preservado o bem estar da coletividade.
Art. 1.334 do Código Civil
O Código Civil, no capítulo que trata do condomínio edilício (arts. 1.331 a 1.358-A), determina no artigo 1.334, assim:
Art. 1.334. Além das cláusulas referidas no art. 1.332 e das que os interessados houverem por bem estipular, a convenção determinará:
I – a quota proporcional e o modo de pagamento das contribuições dos condôminos para atender às despesas ordinárias e extraordinárias do condomínio;
II – sua forma de administração;
III – a competência das assembleias, forma de sua convocação e quorum exigido para as deliberações;
IV – as sanções a que estão sujeitos os condôminos, ou possuidores;
V – o regimento interno. (grifou-se)
No entanto, ainda que preveja a possibilidade de sanções, existem outros aspectos que devem ser observados no que se refere ao condômino inadimplente.
Art. 1.335 do Código Civil
O artigo 1.335 do Código Civil, por sua vez, dispõe o seguinte:
Art. 1.335. São direitos do condômino:
I – usar, fruir e livremente dispor das suas unidades;
II – usar das partes comuns, conforme a sua destinação, e contanto que não exclua a utilização dos demais compossuidores;
III – votar nas deliberações da assembléia e delas participar, estando quite. (grifou-se)
Como se vê, portanto, o direito de usufruir e gozar que assiste ao titular do domínio de uma determinada unidade autônoma vai além dela. Recai, desse modo, também sobre as partes comuns. Isto porque a propriedade da unidade imobiliária abrange a correspondente fração ideal de todas as partes de utilização comum do imóvel.
Consequente, isto gera impactos nos direitos do condômino inadimplente.
Entendimento jurisprudencial sobre o condomínio
Nesse aspecto, a posição jurisprudencial mais recente acerca da questão do condômino inadimplente caminha no sentido de considerar como ilícito o ato consistente na privação do condômino que consta em atraso com suas obrigações condominiais, da fruição das partes comuns do prédio, assim como a inclusão de disposição condominial que proíbe o uso dessas áreas no intuito de coagir o condômino ao pagamento das taxas. Ou seja, é um verdadeiro abuso de direito.
O raciocínio adotado pelo Superior Tribunal de Justiça está afinado, então, com a disposição contida no já mencionado Código Civil, o qual prevê os meios legais específicos para buscar o adimplemento devido, sem que com isso seja causado algum constrangimento à dignidade do condômino e dos demais moradores.
Extrai-se da decisão que tratou da matéria em nossa corte cidadã que:
[…] o legislador, quando quis restringir ou condicionar o direito do condômino, em razão da ausência de pagamento, o fez expressamente (CC, art. 1.335). Ademais, por questão de hermenêutica jurídica, as normas que restringem direitos devem ser interpretadas restritivamente, não comportando exegese ampliativa.(STJ RESP nº 1.699.022 – SP. Rel. Min. Luis Felipe Salomão).
Sanções legais ao inadimplemento conforme o Código Civil
Nesse passo, torna-se oportuno enumerar as sanções legais trazidas pelo Código Civil e citadas no julgado supramencionado, cujo objetivo é justamente compelir o condômino inadimplente a promover a quitação da sua obrigação perante o condomínio sem com isso gerar qualquer tipo de situação vexatória, sendo elas:
- ficar automaticamente sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, ao de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o débito (§ 1°, art. 1.336 do Código Civil);
- o direito de participação e voto nas decisões referentes aos interesses condominiais poderá ser restringido (art. 1.335, III do Código Civil); (tema que já foi trazido aqui)
- possibilidade de incidir a sanção do art. 1.337, caput, do CC, sendo obrigado a pagar multa em até o quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, conforme a gravidade da falta e a sua reiteração;
- possibilidade de haver a perda do imóvel, por ser exceção expressa à impenhorabilidade do bem de família (Lei n° 8.009/90, art. 3º, IV).
Crédito condominial no Novo CPC
Nesse ponto, quanto a última possibilidade apontada, consigna-se que o Novo Código de Processo Civil inovou ao trazer no rol dos títulos de crédito o crédito condominial. Veja-se a redação do art. 784 do Novo CPC:
Art. 784. São títulos executivos extrajudiciais:
[…]X – o crédito referente às contribuições ordinárias ou extraordinárias de condomínio edilício, previstas na respectiva convenção ou aprovadas em assembleia geral, desde que documentalmente comprovadas;
[…]
Isso significa dizer, portanto, que o caminho para cobrar os créditos dessa natureza fora potencialmente diminuído, notadamente porque além do procedimento executivo realizar-se ao melhor interesse do credor (CPC, art. 797), ele visa a expropriação de bens do executado, de modo que sendo ajuizada a ação de execução, o devedor, nesse caso, condômino inadimplente, será citado para efetuar o pagamento da dívida e dos honorários advocatícios dentro do prazo de três dias, sob pena de penhora.
Por fim, torna-se importante esclarecer que a jurisprudência recente admite que a restrição do condômino ao exercício do seu direito dominial sobre as frações ideais das partes comuns do prédio, pode ensejar em indenização por dano moral,
Cabe indenização por danos morais ao condômino inadimplente que tem seus direitos restringidos?
Sobre a indenização por danos morais ao condômino inadimplente, observa-se, então, a ementa trazida abaixo:
1. Consoante entendimento firmado pelo colendo Superior Tribunal de Justiça o direito do condômino ao uso das partes comuns do condomínio, seja qual for a destinação a elas atribuídas, não decorre da situação de adimplência das despesas condominiais, mas sim do fato de que, por lei, a unidade imobiliária abrange, como parte inseparável, não apenas uma fração ideal no solo, mas também outras partes comuns, que são identificadas em forma decimal ou ordinária no instrumento de instituição do condomínio, de modo que a sanção que obsta o condômino em mora de ter acesso a uma área comum, por si só, desnatura o próprio instituto do condomínio, limitando, indevidamente, o correlato direito de propriedade (Resp nº 1.564.030/MG).
2. Impedir que o condômino utilize áreas comuns de lazer do Condomínio, ainda que esteja inadimplente, configura ilícito civil, porquanto implica em violação ao direito de propriedade e à dignidade da pessoa humana, o que enseja compensação a título de danos morais.
3. Para a fixação do valor de compensação dos danos morais, deve o magistrado pautar sua avaliação levando em conta as circunstâncias do ocorrido, a capacidade econômica das partes e a extensão do dano experimentado, atentando-se, ainda, para que o quantum não seja estipulado em patamar tão alto que consubstancie enriquecimento sem causa da vítima, nem tão ínfimo que não sirva como desestímulo à prática de novas condutas pelo agente causador do dano. Observadas tais premissas, não há justificativa para redução do montante arbitrado.
4. Apelação conhecida e não provida.
(TJ-DF 07009322720188070007. Relator: SIMONE LUCINDO. 1ª Turma Cível. Dje: 10/10/2019) (grifou-se)
Restrição aos direitos do condômino inadimplente é possível?
Dessa forma, diante das ponderações trazidas aqui, é possível concluir que se deve tomar muita cautela antes de incluir nos regramentos do condomínio alguma restrição de direito dos condôminos, inclusive do condômino inadimplente.
É imprescindível, assim, a busca por conhecimento especializado, sobretudo porque o direito a propriedade encontra grande prestígio no Direito Brasileiro.
Até a próxima.
Fonte: Saj